Nos próximos anos, o mercado imobiliário brasileiro vai enfrentar uma mudança importante: a tributação das LCIs (Letras de Crédito Imobiliário), que sempre foram conhecidas por sua isenção de Imposto de Renda.
Neste artigo, vamos explicar em detalhes o que são as LCIs, o que muda com a reforma tributária, como isso afeta o financiamento de imóveis e quais estratégias podem ser adotadas por investidores, compradores e empresários para se adaptar a esse novo cenário.
O que é LCI e por que é isenta de IR atualmente?
A Letra de Crédito Imobiliário (LCI) é um título de renda fixa emitido por bancos para captar recursos destinados ao financiamento do setor imobiliário. Em termos simples, ao investir em uma LCI, você está emprestando dinheiro ao banco, que usará esses recursos para conceder empréstimos imobiliários (como financiamentos habitacionais). Em troca, o investidor recebe juros sobre o valor aplicado, de forma semelhante a outros investimentos de renda fixa tradicionais.
Um grande atrativo das LCIs sempre foi a isenção de Imposto de Renda (IR) para pessoas físicas, prevista em lei como incentivo ao investimento no mercado imobiliário. Isso significa que todo rendimento obtido com LCI por investidores individuais é líquido, sem a mordida do IR.
Graças a essa vantagem fiscal, as LCIs conseguem oferecer retornos efetivos muitas vezes superiores aos da poupança e até competitivos com outros produtos tributados, como CDBs, mesmo que a taxa bruta da LCI seja um pouco menor. Além disso, as LCIs contam com a proteção do Fundo Garantidor de Créditos (FGC) até o limite de R$ 250 mil por CPF e por instituição financeira, conferindo segurança semelhante à da poupança e CDBs para a maioria dos investidores.
Essa combinação de rendimento atrativo e isenção de IR fez das LCIs uma opção popular entre investidores conservadores que buscam boa rentabilidade na renda fixa sem pagar imposto. Contudo, é importante notar que a isenção vale apenas para pessoas físicas (indivíduos).
Investimentos feitos por empresas em LCI já são tributados normalmente, sem esse benefício. Até aqui, portanto, LCIs vinham proporcionando ganhos líquidos elevados com baixo risco, tornando-se parte importante das estratégias de investimento e também uma fonte significativa de recursos para o crédito imobiliário no Brasil.
O que muda com a reforma tributária de 2025? A nova tributação das LCIs
Dentro da Reforma Tributária de 2025, uma das propostas do governo federal é acabar com a isenção de IR sobre os rendimentos das LCIs (e das LCAs, suas equivalentes do agronegócio). Em junho de 2025, foi editada a Medida Provisória 1.303/25 prevendo a cobrança de Imposto de Renda na fonte, de 5%, sobre títulos que hoje são isentos.
Essa alíquota fixa de 5% seria aplicada a partir de 1º de janeiro de 2026, respeitando o princípio da anualidade, e valeria inicialmente para novas aplicações realizadas a partir dessa data. Ou seja, investimentos em LCI feitos até 31/12/2025 permaneceriam isentos até o cvencimento, enquanto títulos emitidos a partir de 2026 passariam a ter tributação sobre os juros.
Durante a tramitação no Congresso, porém, o relatório do deputado Carlos Zarattini sugeriu ajustes. A versão mais recente da proposta eleva a alíquota de IR para 7,5% sobre os rendimentos de LCI/LCA para pessoas físicas, em vez dos 5% iniciais. Ao mesmo tempo, manteve isentos outros títulos imobiliários incentivados como os CRI (Certificados de Recebíveis Imobiliários) e os Fundos Imobiliários (FIIs) para investidores pessoa física.
Em outras palavras, as LCIs perderiam parte da vantagem tributária exclusiva que possuíam, passando a pagar um IR modesto – porém não mais zero – nos novos investimentos realizados a partir da vigência da lei.
É importante destacar que, apesar dessa mudança, a tributação proposta ainda é bem inferior às alíquotas de outros investimentos de renda fixa comuns. Hoje, um CDB, por exemplo, paga entre 15% e 22,5% de IR sobre os rendimentos (seguindo a tabela regressiva conforme o prazo).
Já a LCI passaria a pagar apenas 5% a 7,5%, dependendo do texto final aprovado. O governo argumenta que essa medida visa reduzir distorções no mercado, aproximando a carga tributária entre diferentes produtos financeiros e ampliando a base de arrecadação sem aumentar impostos diretos. Estimativas oficiais apontam uma potencial arrecadação adicional de até R$ 18 bilhões nos próximos anos com o fim da isenção das LCIs/LCAs.
Outra observação: apenas novos investimentos serão afetados. Quem já possui LCI atualmente ou aplicar até o fim de 2025 deve continuar isento de IR nesses títulos até seu vencimento, graças à regra de transição prevista. Isso dá aos investidores uma janela para se adequarem.
Ainda assim, a expectativa é que a atratividade das LCIs diminua gradativamente a partir de 2026, já que a rentabilidade líquida ficará um pouco menor do que antes. Nos tópicos a seguir, veremos como essa mudança pode impactar diretamente o financiamento imobiliário, tanto para quem busca comprar imóveis quanto para o setor como um todo.
Impacto no financiamento de imóveis: o que muda para compradores e para o mercado?
LCIs desempenham um papel-chave no financiamento imobiliário, pois os recursos captados pelos bancos via LCI são direcionados para empréstimos habitacionais e operações imobiliárias.
Com a nova tributação, diversos especialistas alertam que o custo do crédito imobiliário pode aumentar, encarecendo financiamentos para os compradores de imóveis e reduzindo o fôlego do mercado imobiliário como um todo. Em outras palavras, financiar a casa própria pode ficar mais caro nos próximos anos.
Associações do setor, como a CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), projetaram já na proposta inicial de 5% de IR que haveria um impacto significativo: uma alta de até 0,7 ponto percentual nas taxas de financiamento habitacional, aumentando o valor das parcelas pagas pelos mutuários.
Com a alíquota agora sugerida em 7,5%, o efeito poderia ser ainda maior. Isso significa que um empréstimo imobiliário que antes, por exemplo, tinha juros de 8% a.a. poderia passar para algo como 8,5% a 8,7% a.a. devido ao repasse do custo adicional – um acréscimo que, ao longo de 20-30 anos de financiamento, faz diferença no bolso do comprador.
Com a alíquota agora sugerida em 7,5%, o efeito poderia ser ainda maior. Isso significa que um empréstimo imobiliário que antes, por exemplo, tinha juros de 8% a.a. poderia passar para algo como 8,5% a 8,7% a.a. devido ao repasse do custo adicional – um acréscimo que, ao longo de 20-30 anos de financiamento, faz diferença no bolso do comprador.
Do ponto de vista do comprador de imóvel, especialmente aqueles que dependem de financiamento bancário, essa mudança pode afetar diretamente o orçamento. Prestação mais alta ou crédito mais difícil significa que alguns consumidores poderão postergar a compra da casa própria ou ter de buscar imóveis de menor valor para caber no orçamento mensal.
Para quem compra imóveis novos das incorporadoras ou imóveis usados via financiamento, o encarecimento do crédito torna a compra mais onerosa e pode reduzir a demanda no mercado.
Leia também: A informalidade de aluguéis acabou, veja o que muda!
Por isso, representantes do setor têm manifestado preocupação: segundo o presidente da Caixa Econômica Federal (principal banco de financiamento habitacional), a LCI funciona como um “indutor de longa cauda” da construção civil – ou seja, impulsiona uma cadeia de atividades no setor imobiliário – e tributar esse instrumento pode frear esse impulso.
Para o mercado imobiliário como um todo, a tributação das LCIs chega num momento delicado. Nos últimos anos, houve forte retração na caderneta de poupança, que tradicionalmente é a principal fonte de recursos para empréstimos habitacionais no Brasil.
Dados da Abecip (Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança) mostram que a participação das LCIs nas fontes de financiamento imobiliário dobrou de 11% para 22% entre 2020 e 2023, enquanto a fatia da poupança caiu de 47% para 31%.
Isso ocorreu porque, com saques líquidos constantes da poupança e alta demanda por crédito imobiliário, os bancos recorreram cada vez mais às LCIs para levantar dinheiro e continuar emprestando para a compra e construção de imóveis.
Nesse contexto, taxar as LCIs pode esfriar essa fonte alternativa crucial de funding. Se menos investidores tiverem interesse em LCI (ou exigirem juros maiores para investir), os bancos podem enfrentar dificuldades para manter o volume de empréstimos imobiliários no mesmo ritmo.
Em última instância, isso pode significar crédito mais escasso ou mais caro para construção de novas casas e empreendimentos, impactando incorporadoras e toda a cadeia da construção civil.
Resumindo, o impacto direto da tributação de LCI no financiamento de imóveis deve ser um aumento gradual nos juros dos financiamentos habitacionais e possivelmente uma oferta de crédito menor do que haveria caso a isenção fosse mantida.
O efeito exato dependerá de como os bancos e investidores vão reagir a essa mudança (como veremos adiante), mas é prudente que compradores e players do mercado já se preparem para um cenário de financiamentos um pouco menos vantajosos daqui para frente.
A relação das LCIs com a captação bancária e o crédito imobiliário
As LCIs existem justamente para conectar investidores que buscam rendimento com a necessidade dos bancos de obter recursos para emprestar no setor imobiliário.
Antes dessa mudança, essa conexão era benéfica para ambos os lados: o investidor ganhava um bom retorno isento de imposto, e o banco conseguia dinheiro a um custo menor para repassar em financiamentos. Isso porque, devido à isenção de IR, os investidores aceitavam ganhar uma taxa menor em LCI do que exigiriam em outros produtos de risco semelhante, como CDBs ou títulos públicos.
Na prática, a LCI barateava o custo de captação para os bancos, já que eles podiam pagar, por exemplo, 95% do CDI em uma LCI (que equivalia a 95% líquido para o investidor pessoa física), em vez de ter que pagar 110% do CDI num CDB para oferecer o mesmo retorno líquido (considerando a tributação do CDB).
Com a tributação das LCIs, essa dinâmica muda parcialmente. Investidores passarão a exigir uma remuneração maior pelas LCIs, pois agora terão que descontar o IR sobre os juros recebidos. Se antes 95% do CDI líquido já era atraente, agora será preciso pagar um percentual maior do CDI para atingir o mesmo rendimento líquido.
Especialistas calculam que, para uma LCI de prazo ~1 ano que rendia 100% do CDI isenta, será necessário ela render cerca de 107-108% do CDI bruto para entregar o mesmo 100% líquido sob uma alíquota de 7,5%. Ou seja, os bancos terão de elevar as taxas oferecidas nas novas LCIs para continuar captando recursos dos investidores pessoas físicas. Esse aumento de custo de captação tende a ser repassado, ao menos em parte, aos juros cobrados nos empréstimos imobiliários (ou reduzido das margens dos bancos).
Vale lembrar que os bancos já contam com outras fontes de captação direcionadas ao crédito imobiliário, principalmente a caderneta de poupança e também instrumentos como a LIG (Letra Imobiliária Garantida) e operações de securitização (CRI).
A poupança, por exemplo, tem juros regulados (atualmente 6,17% ao ano + TR quando a Selic está acima de 8,5%) e é isenta de IR, mas nos últimos tempos sofreu saques líquidos elevados, limitando seu aporte ao setor.
As LIGs e CRIs são alternativas: CRI (Certificados de Recebíveis Imobiliários) são títulos lastreados em créditos imobiliários, também isentos de IR para pessoa física e usados para captar dinheiro para projetos específicos ou carteiras de financiamentos. No entanto, CRIs geralmente não têm a garantia do FGC e podem ter riscos maiores, então pagam juros maiores e são mais buscados por investidores sofisticados.
Com a taxação das LCIs, é possível que parte dos recursos migre para produtos concorrentes. Investidores que valorizam a isenção podem optar por CRI/CRA (que seguem isentos) ou por Fundos Imobiliários (FIIs), que tiveram sua isenção de rendimentos mantida na reforma. Porém, é importante notar que cada produto tem características de risco, liquidez e prazo diferentes.
A poupança deve continuar isenta e com liquidez diária, mas sua rentabilidade tende a ser menor em cenários de juros altos (e depende da política de juros do governo). Já debêntures incentivadas (como as de infraestrutura) seguem isentas para pessoas físicas na nova proposta, mas não são focadas em imóveis e geralmente financiam outros setores.
Para os bancos, o desafio será reorganizar o mix de funding para o crédito imobiliário. Se as LCIs ficarem menos atrativas e a captação cair, eles podem recorrer mais aos CRIs ou outros instrumentos, ou até limitar um pouco a oferta de crédito.
Alguns bancos talvez repassem integralmente a taxa de 5-7,5% ao investidor (oferecendo juros um pouco maiores nas LCIs novas) para manter a competitividade das letras. Outros podem promover mais seus fundos imobiliários ou carteiras de crédito securitizadas como forma de captar dinheiro.
Em suma, a LCI continuará sendo uma peça importante do quebra-cabeça do financiamento habitacional, mas terá um custo de captação maior para os bancos, que precisarão se adaptar a esse novo cenário. E, como vimos, isso tende a refletir em condições um pouco menos vantajosas para tomadores de empréstimo imobiliário.
Reações do mercado e de especialistas à mudança
A proposta de tributar as LCIs provocou diversas reações de entidades do mercado financeiro e imobiliário. De um lado, o governo e alguns economistas defendem a medida como necessária para aumentar a arrecadação e corrigir distorções.
Segundo o Ministério da Fazenda, “os títulos deixarão de ser isentos mas continuarão bastante incentivados”, já que 5% (ou mesmo 7,5%) ainda é uma alíquota baixa comparada aos 15%-17,5% cobrados em outros investimentos.
Nesse sentido, argumenta-se que a vantagem da LCI não acaba, apenas diminui um pouco, tornando a competição entre produtos mais justa e evitando que decisões de investimento sejam guiadas unicamente por diferença de tributação.
Por outro lado, representantes do setor imobiliário, bancos e investidores têm manifestado preocupações. A Abecip, associação das instituições de crédito imobiliário, alertou que as LCIs desempenham um papel estratégico no financiamento habitacional, ainda mais agora que a poupança perdeu fôlego, e que tributar esses papéis pode elevar os juros finais ao consumidor e reduzir a oferta de crédito.
A CBIC e outras entidades da construção civil chegaram a elaborar notas técnicas apontando impactos negativos, como o possível aumento de até 0,7 ponto percentual nas taxas de financiamento, conforme mencionado.
Especialistas em investimentos têm comentado que a mudança, apesar de reduzir a atratividade das LCIs, não chega a inviabilizá-las. Muitos lembram que, mesmo com 5%-7,5% de imposto, a LCI ainda terá rendimentos líquidos interessantes e menor IR que a maioria dos títulos de renda fixa. No curto prazo, é possível que haja alguma migração de recursos para alternativas isentas (como CRIs, FIIs ou poupança), mas também se espera uma adaptação gradual do mercado de renda fixa.
Outro ponto lembrado por analistas é a situação macroeconômica. Caso os juros básicos da economia voltem a cair nos próximos anos (o que tende a ocorrer se a inflação permanecer controlada), a diferença de rentabilidade entre produtos pode mudar.
Em suma, o mercado recebeu a notícia da tributação das LCIs com uma dose de preocupação, principalmente pelo potencial efeito no crédito imobiliário. Porém, muitos reconhecem que “veio menos pior do que poderia” – afinal, discute-se uma alíquota pequena (5-7,5%) e vários produtos permanecem isentos (FIIs, CRIs, etc.), diferente de cenários temidos em que até fundos imobiliários perderiam isenção.
Ainda assim, a recomendação quase unânime entre especialistas é: acompanhar de perto a tramitação da lei e seus desdobramentos, e já ir se ajustando ao novo normal de renda fixa com um pouco de imposto.
Estratégias e recomendações para investidores e compradores frente ao novo cenário
Diante da tributação das LCIs, tanto investidores quanto quem planeja comprar imóveis financiados devem adotar estratégias para se adaptar sem grandes sobressaltos. Confira algumas recomendações práticas:
- Reavalie sua estratégia de investimentos: Se você é investidor, é hora de revisar a composição da sua carteira de renda fixa. As LCIs continuam sendo boas opções, mas agora exigem um olhar atento ao rendimento líquido.
- Antecipe oportunidades (quando possível): Até o final de 2025, ainda é possível encontrar LCIs isentas de IR. Se houver ofertas com prazos e taxas atrativas que caibam em sua estratégia, considerar investir antes da virada do ano pode garantir rendimentos livres de imposto até o vencimento do título (lembrando que, após 2026, novas LCIs terão o IR).
- Fique de olho nas taxas de financiamento imobiliário: Se você pretende comprar um imóvel financiado, acompanhe as movimentações dos juros nos próximos meses. Como explicamos, existe pressão para uma leve alta nas taxas de financiamento devido à tributação das LCIs.
- Negocie e compare opções de crédito: Os bancos podem reagir de formas distintas a essa mudança. Alguns talvez elevem imediatamente os juros dos financiamentos; outros podem segurar para não perder clientes, ou criar promoções temporárias.
- Conte com ajuda especializada: Tanto para investimentos quanto para financiamento de imóveis, esse é um momento em que consultar especialistas pode fazer diferença.
Conclusão
A tributação das LCIs representa uma mudança relevante no mercado imobiliário brasileiro. Ela impactará tanto investidores quanto compradores e instituições financeiras, exigindo planejamento e adaptação. Embora os rendimentos possam diminuir e os juros aumentar ligeiramente, com estratégia e orientação adequada é possível minimizar impactos e aproveitar oportunidades.
A CLM Controller é uma contabilidade com mais de 40 anos de experiência, especializada em empresas do Lucro Real e Lucro Presumido, atuando em diversas áreas como contábil, tributária, financeira e folha de pagamento. Também oferecemos consultoria estratégica, planejamento tributário e auditoria especializada para garantir que sua empresa esteja sempre em conformidade e aproveite ao máximo as oportunidades fiscais.
Quer entender como as mudanças na tributação podem afetar seus investimentos e negócios? Entre em contato e fale com um de nossos especialistas hoje mesmo.